15 de outubro de 2008

LEDA E O CISNE (William Butler Yeats)


(Um soneto, apenas um soneto: obra máxima de concisão. Mas toda uma história, que mistura o lendário e o real, a ponto de não sabermos mais distinguir o que é verdade do que é ficção. Mas a arte também é real, porque também é construção. A História é terror, violência e fascinação... e morte! O Monstro que encanta e estupra. A Arma que seduz e assassina. Um ciclo que engendra a humanidade e do qual ela jamais se libertará.)



LEDA AND THE SWAN


A sudden blow: the great wings beating still

Above the staggering girl, her thighs caressed

By the dark webs, her nape caught in his bill,

He holds her helpless breast upon his breast.


How can those terrified vague fingers push

The feathered glory from her loosening thighs?

And how can body, laid in that white rush,

But feel the strange heart beating where it lies?


A shudder in the loins engenders there

The broken wall, the burning roof and tower

And Agamemnon dead.

Being so caught up,


So mastered by the brute blood of the air

Did she put on his knowledge with his power

Before the indifferent beak could let her drop?



LEDA E O CISNE


Um baque súbito. A asa enorme ainda se abate

Sobre a moça que treme. Em suas coxas o peso

Da palma escura acariciante. O bico preso

À nuca, contra o peito o peito se debate.


Como podem os pobres dedos sem vigor

Negar à glória e à pluma as coxas que se vão

Abrindo e como, entregue a tão branco furor,

Não sentir o pulsar do estranho coração?


Um frêmito nos rins haverá de engendrar

Os muros em ruína, a torre, o teto a arder

E Agamênnon, morrendo.

Ela, tão sem defesa,


Brutalizada pelo abrupto sangue do ar,

Se impregnaria de tal força e tal saber

Antes que o bico inerte abandonasse a presa?

(trad. de Augusto de Campos)

13 de outubro de 2008

DESCORTÍNIO




(A Samara Sieber)




Descobre no fundo do poço o riso
Com que animas a madrugada fria.
Sabes a vento, penetras o siso
E voas de brilho a imensidão do dia!

Amada, ao lado de ti é Paraíso
Todo breu que circunda a sombra esguia!
Semeias flores e frutos no liso
Estéril. És flor vinda da agonia...

Escavas nas palavras o teu ser,
Amas as montanhas, os rios, os vales...
Onde estavas, ave do infinito?

Agora que me prendes no viver
Que espraias além de todos os males,
Vivemos nosso mundo mais bonito!

7 de outubro de 2008

FÚRIA (Fábio Santos e Samara Sieber)

Na fibra da tarde que aguarda o luar,
foi teu o murmúrio que ouvi ao gritar:
amores e cóleras tênues de luz
(e tudo o que dizes é a paz e seduz).

Entanto me matas,
asfixias meu sol,
engasgas o hálito da minha calma:
onde estás quando me persegues?

No meu ventre, nos meus sonhos,
em lugar qualquer da minha alma?
Lambes meus versos, minhas rimas,
minhas verdades, minhas mentiras.

Invades aquilo que eu penso ser
o meu corpo:
mas é a minha alma.
Tenho medo de ti.