12 de fevereiro de 2007

O limite da maldade

Rousseau afirmava, na sua filosofia luminosa, que o homem é naturalmente bom, mas passa a ser corrompido pela sociedade. Isso, que na sua época (século XVIII) deve ter sido bastante revolucionário, confrontando-se com a situação estabelecida do Antigo Regime, hoje tornou-se um clichê, daqueles que se repetem à exaustão em discursos sensacionalistas ou falsamente esquerdistas. Se "a propriedade é um roubo", então a solução mais eficaz para restabelecer a paz entre os homens é distribuir os bens de forma igualitária, acabar com a desigualdade social, entre outras saídas possíveis. Simples e brilhante como a água de um manancial...
Se analisarmos tudo objetivamente, é relativamente fácil resolver tais questões. Mas eu me pergunto se, nas condições que encontramos atualmente - um mundo desmesuradamente feito de aparências, de lucros, de quantidades exorbitantes, de desejos tão intensos quanto passageiros -, seria possível realizar uma reforma tão profunda e definitiva. Essa pergunta, um tanto banal e adolescente, origina-se de uma angústia intemporal e refletida: como podemos reformar o mundo, se não somos capazes de mudar o nosso interior? Queremos um mundo melhor, mas o que oferecemos a esse mundo para que ele se torne melhor?
O homem se transformou (ou sempre foi assim?) num "buraco negro". Mais, mais, mais... Uma voracidade pelas coisas, uma incapacidade de perceber o outro, uma insensibilidade em relação ao outro.
Por que dizer isso? Ah - você deve estar pensando -, mais um que vai falar de "vamos lutar por um mundo de paz", "vamos nos dar as mãos" etc. Não, não direi isso. Apenas quero propor que pensemos - isso você pode fazer sozinho.
Um fato: três homens (na falta de um nome mais apropriado) roubam um carro no qual estavam uma mulher e seus filhos (uma menina de 14 anos e um menino de seis anos); elas saem do carro e tentam tirar o menino, mas ele ficou preso ao cinto de segurança do banco de trás; um dos assaltantes toma a direção do automóvel e parte; a criança, cuja mãe não conseguiu retirá-lo do carro, fica preso ao carro em movimento; do lado de fora, percorre uns sete quilômetros da cidade do Rio de Janeiro; as pessoas por quem o carro passa gritam, avisam, mas o motorista não pára.
Um conto de Kafka? Um filme de Hollywood? Uma piada? Não: um fato. A realidade.
Aconteceu mesmo. O único questionamento a se fazer é o seguinte: qual o limite da maldade humana? Pense no pior tipo de perversão, no pior castigo, na pior forma de maltratar uma pessoa. Aposto que você não chegará perto do que aconteceu na semana passada no Rio de Janeiro. "Mas essas pessoas que fizeram isso não eram pessoas..." Ah não, eram o quê? Eram seres humanos, sim. Eu juro.
Estamos chocados, pasmados, mas o que faremos quando o choque passar? Comentaremos de vez em quando, por exemplo num elevador, numa fila de banco, num ponto de ônibus, numa conversa com o amigo pelo telefone, sempre que um assunto faltar diremos: "Nossa, você viu aquilo?" E logo, para não "criar clima", falaremos de alguma celebridade, dos "agitos do BBB", algo assim.
Realmente, nós somos muito bons. Somos solidários, ficamos imaginando a dor da mãe, do pai, mas a cerveja que nos espera na balada também é uma necessidade, afinal somos seres humanos. Somos bons, mas sempre há algo que nos corrompe.
Valete, Fratres!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

As suas palavras